'Pirata' engana emergência
Noticia saída no Diário de Notícias, Quarta, 25 de Agosto de 2010
Um 'pirata' radioamador está a usar abusivamente frequências reservadas para lançar falsos pedidos de auxílio, subtraindo meios de busca e salvamento preciosos em terra e no mar. Esta brincadeira de mau gosto - crime nos termos da lei - tem sido prática reiterada desde 20 de Fevereiro e já lançou a confusão nas linhas de emergência da Região. A delegação regional da ANACOM (Autoridade Nacional de Comunicações) e a Polícia Marítima encabeçam uma investigação conjunta e já têm pistas para interceptar o prevaricador.
Na Madeira são reconhecidos pela ANACOM 244 radioamadores a título individual, aos quais se juntam duas associações, mais a Protecção Civil. O abuso da frequência interdita àquele 'hobby' tem sido acompanhado por um radioamador que denunciou, no espaço 'cartas de leitor' deste matutino, as sucessivas situações, reportadas às autoridades, por não querer ver manchada a actividade de radioamador na Madeira.
O delegado regional da ANACOM, Nelson Melim, diz que não estamos perante uma simples interferência nas telecomunicações confinadas às autoridades e às instituições de socorro. "É uma utilização ilegal e abusiva daquela frequência", aponta. "Ou seja, é um radioamador que, abusivamente, está a entrar em frequências que não pode".
Exemplo disso foi o último episódio, ocorrido na madrugada da terça-feira da última semana, quando uma chamada de sinal inconstante e de voz enrolada na frequência da Marinha (CH 16), simulou um pedido de auxílio a sul da Calheta, fornecendo o nome de uma embarcação falso. A ligação, mantida ao longo de meia hora, só não enganou a autoridade marítima porque um radioamador denunciou o 'embuste' do colega.
Para Nelson Melim, não se trata de um interferência involuntária como por vezes acontece com fenómenos radioeléctricos em frequências restritas. Considera este caso bem mais grave, pois há uma intenção dolosa.
"Uma situação deste tipo de interferência em linhas de emergência é um processo crime, não se resume a uma contra-ordenação financeira. E além disso, põe em causa uma série de danos morais", sustenta o delegado da ANACOM na Madeira.
"O facto de estar a accionar meios de emergência e de estar a chamá-los para uma situação que não existe, acaba por subtrair meios de socorro para uma situação real que eventualmente possa estar a acontecer à mesma hora", observa.
O engenheiro Nelson Melim tranquiliza, garantindo que "desde a primeira situação que a ANACOM e a autoridade marítima na Madeira, têm falado, estão em perfeita sintonia e têm trabalhado".
"Da nossa parte posso dizer que estão a ser feitos esforços necessários para que essa situação seja terminada e é sempre importante denunciar este crimes, que não podem ser levados como uma mera brincadeira", frisa.
Embora recuse revelar pormenores técnicos sobre as ferramentas disponíveis para interceptar a origem do sinal do radioamador 'pirata', Nelson Melim adianta que ANACOM e Polícia Marítima já têm "alguns indícios".
"Houve situações distintas em que o radioamador entrou na frequência de determinadas entidades", confirma, sem entrar em detalhes.
Esta intromissão abusiva não é, porém, um caso pontual. Tem havido registos de abusos na utilização das frequências reservadas às entidades que operam na busca e salvamento em mar e nas missões de emergência em terra, desde que a aluvião de 20 de Fevereiro desligou, temporariamente, as telecomunicações convencionais na ilha e obrigou à utilização de frequências alternativas. Terá sido nessa altura que nasceu o 'pirata' radioamador.
Processo moroso
O delegado regional da ANACOM explica que a detenção em flagrante delito no domínio das telecomunicações tem de ser feito com rigor técnico e não é um processo fácil, directo e imediato. Envolve, aliás, muito dispêndio de paciência e o empenho de diversos equipamentos técnicos.
"Há que entender que estes fenómenos radioeléctricos são esporádicos. É tudo uma questão de probabilidades", argumenta.
Diz que o prevaricador tem de ser interceptado em flagrante e através de uma rápida localização do sinal que invade a frequência. Explica que na maior parte das vezes, este tipo de transmissões ocorrem em escassos segundos ou minutos, o suficiente para confundir as autoridades e desencadear uma operação de busca e salvamento, sem porém, ser possível detectar a sua origem, localizar ou identificar o infractor.
Daí a demora na detenção do 'pirata'. "Essa é uma das razões", considera o engenheiro.
Garante, de resto, que "a delegação regional da ANACOM e a autoridade marítima da Madeira estão em perfeita sintonia e colaboração".